Monday, December 11, 2017

às vezes um chá é a única solução. e acaba por saber melhor do que qualquer pensamento ou gesto profundo. um chá, simplesmente um chá. seja do que for, desde que não daqueles muito amargos. é tão bom manter a força das coisas!

Saturday, October 28, 2017

o mundo que já não há-de vir

o mundo que já não há-de vir porque ficou desfeito na minha boca ao tentar pronunciá-lo, em vão. mas não faz mal, provavelmente é melhor assim. quem sabe seja mesmo este o melhor dos mundos possíveis, mesmo que incompossível para nós? perdemo-nos pelo caminho. foi um caminho árduo demais. acontece. gosto do silêncio que entretanto cresceu entre nós, como que uma erva daninha que lentamente se instala, se apodera e passa a ditar o horizonte que a rodeia. gosto deste silêncio, gosto desta vontade do não, gosto deste prazer absolutamente novo para mim da decadência. gosto do fim. gosto de projectar o fim, de o fantasiar, de o vestir a rigor e gosto ainda mais de ir saboreando a sua construção lenta, delicada, que se vai metamorfoseando em dia-a-dia. um dia estarei pronta para morrer definitivamente, para lá destas pequeninas mortes quotidianas. cada dia é um dia, dizem-me. e eu rio cá dentro, alimentando a minha tristeza já resistente aos dias. um dia há-de ser. um dia há-de vir. gostei imenso de todos os possíveis que imaginei. foram porreiros, pá. que desperdício que a vida pode ser! mas vá, um beijo sabe sempre bem e dá um óptimo final. até sempre!

Wednesday, October 18, 2017

era um redondo vocábulo e uma soma agreste, por favor.

Wednesday, October 04, 2017

situação existencial

ultimamente tenho-me deparado com uma situação, digamos, existencial (reparem: eu não me refiro a «problema», porque não o é. é só uma «situação» existencial): eu não tento ser uma boa pessoa. por ex: não me esforço por agradar ninguém (a não ser os que mais amo), não exercito a boa acção como mandamento do quotidiano, passam-me coisas pela cabeça que escandalizariam muita gente, tenho um certo gosto pela obscenidade, enfim, tenho um rol até bem grandito de exemplos que fazem de mim uma não-boa pessoa.
isto cria-me um certo desconforto, não por uma qualquer ética superior que eu queira alcançar ou praticar, mas precisamente só pelo facto de reparar que constitui uma evidência dentro de mim. talvez desconforto seja demasiado pesado. talvez estranheza, inquietação ou até mesmo surpresa.

Saturday, August 12, 2017

por que tem que ser sempre assim? por que é que a raiva, os gritos, as discussões são o caminho inevitável? por que é que temos sempre algo para dizer que nunca é dito, por medos e desconfianças? por que é que se pratica assim o amor? não saberemos conjugá-lo de outro modo? será que é essa a nossa impossibilidade?
cada vez mais acredito que o maior problema deste mundo é o da comunicação. conseguir atingir a compreensão entre dois seres, duas individualidades distintas, duas diferenças, duas vidas, dois modos de pensar, dois modos de agir, dois modos de sentir, dois passados distintos, duas vontades, duas cabeças e dois corações. é quase um milagre conseguirem entender-se realmente! até podem ter momentos de profunda empatia, mas há sempre um ponto de total impossibilidade. há sempre um impasse, uma fronteira, uma barreira. mesmo entre mães e filhos! às vezes até sobretudo entre mães e filhos. porquê???
estou exausta. cheguei a um ponto em que já nem consigo pronunciar certas palavras, as palavras da discórdia, como responder "não" quando me perguntam se quero algo, ou dizer "mas" ou "no entanto" ou "não é bem assim". cheguei a um ponto de cansaço em que já só consigo dizer "escolham vocês, por mim está tudo ok". pronunciar esta frase é a única energia que me resta. preciso real e urgentemente de férias de tudo e de todos, de férias deste mundo!

Wednesday, August 02, 2017

impossibilidades mortais

Naquele fim de tarde, a minha mãe precisava de ir e eu até queria fazer-lhe companhia, mas estava demasiado deliciada a viver a preguiça lânguida e quente das férias de Verão.  Tinha passado o dia todo de pijama, maravilhada a ler um romance que estava quase a terminar e sentia aquele frenesim de terminar o livro antes de adormecer. Mesmo assim, a hesitação insistia dentro de mim e provavelmente até falou mais alto do que a minha atitude e, ouvindo-a, a minha mãe disse:
- só se quiseres vir assim mesmo, não sais do carro, dás só apoio moral...
- apoio imortal, queres tu dizer: ir para apenas permanecer no lugar do morto! não será isso imoral?

Resolvi ficar. Provavelmente seria menos imoral do que ter ido. Afinal, sou mortal.

Tuesday, July 25, 2017

quando o corpo se torna pesado, encho a cabeça de ruído. até que os meus joelhos fiquem em papel e o meu rosto uma nuvem que basta soprar para desaparecer. e bebo um copo de vinho para afogar as mágoas que pesam no meu corpo, como que ensaiando uma vez mais a derrota permanente perante o mundo. solidão. absoluta solidão. às vezes sabe bem, mas outras faz-me desesperar de mim mesma, de ti e de tudo. de ti que nunca conheci, é certo, mas que sei que existes e que me lês. assombras-me e por breves momentos embalas-me, pareces ser afinal o ruído que me preenche, a liberdade que me incrimina, a alegria que me azucrina, a saudade oca do nada total que é um nada igual a menos um. um dia gostava de ser manhã, uma manhã à beira de um lago numa floresta. essa imagem persegue-me como se fosse o meu destino. quero tatuar-me de futuro é o que é! quero preencher-me toda de tudo e mais alguma coisa! quero rebentar de energia! quero morrer de vida!

Saturday, July 15, 2017

os desconhecidos da nossa vida

das muitas noites de dança inesquecíveis, houve uma que de vez em quando ne reaparece na memória, sempre da mesma forma nítida. eu devia ter uns 12-13 anos, a minha irmã tinha entrado para a faculdade de ciências. havia uma festa na cantina do C1 (onde muitos anos mais tarde almocei com regularidade e onde agora está transformada em sala de computadores). lembro-me que a cantina estava toda transformada para receber uma festa muito gira, organizada pelos estudantes de bio-química. foi a primeira vez que bebi uma bebida com vapor líquido, daquele que anos mais tarde viria a encontrar no Bora-bora na Av. Almirante reis, no meio dos amendoins e do ambiente artificial de ilha paradisíaca em jeito de salao de estar de hotel rasca. mas isso é outra história.
naquela noite dancei até ao amanhecer. estávamos em plenos anos 80 dos The Smiths, David Bowie, Lloyd Cole, Nina Hagen e tantos outros, mas por acaso não me lembro das músicas que passaram nessa noite. a memória que tenho é falsa porque é como se tivesse sido uma música só durante toda a noite. uma coisa é certa: dancei a noite toda com um colega da minha irmã que não sei quem é, que nunca tinha visto e que nunca mais voltei a ver. lembro-me só que era baixo, moreno, com muito cabelo. e que dançava tão bem, que ficámos a noite toda a dançar até amanhecer. creio, aliás, que foi a minha primeira directa. lembro-me de sair da faculdade já a amanhecer, de ver o parque de estacionamento com o nascer do sol. (há uma relação muito interessante entre parques de estacionamento e nasceres do sol, mas isso também seria uma outra história. por agora fica como mero apontamento).
dançámos como se nos conhecêssemos desde sempre, como se fossemos um par já habituado de um musical. foi mesmo, mesmo muito especial. Creio que se chamava Nuno, mas não tenho a certeza, nem quero saber, porque ele pertence àquele grupo de desconhecidos que marcaram e fazem parte da minha vida para sempre. E se adoro falar e meter-me com desconhecidos, adoro ainda mais que eles inscrevam a sua não-identidade em mim. adoro ter uma vida na qual fazem parte integrante imensas pessoas desconhecidas. e muitas delas são mais importantes e mais reais, mais genuínas, mais intensas do que outras que, apesar de serem conhecidas, se revelam, afinal, desconhecidas.mas isso também seria uma outra história, triste. pertence ao universo da música "people are strange" dos Doors.
esta de hoje é muito alegre e até afirmativa. estas pessoas desconhecidas trouxeram-me energia, alegria, permitiram-me ser eu, sem mais satisfações. apenas partilhar um qualquer momento e nunca mais nos vermos. é belo. é bonito. e nem sequer se trata de uma excitação sexual ou perversão qualquer. trata-se apenas da beleza dos acasos e dos desconhecidos da nossa vida, porque também é bom não conhecermos tudo o que nos acontece e perdermos um pouco o controlo do rumo da nossa vida. por breves momentos, alguém que não sabemos quem faz parte de nós. e é só isto. e é tanto.

Tuesday, May 09, 2017

a queda de um anjo

9 de maio, 20h30, lua cheia, pós-dia da mãe, pré-vinda do Papa, Portugal parou: era a hora de ouvir o Salvador. Sim, o Sobral. Há qualquer coisa da ordem do sobrenatural quando se ouve o Salvador a cantar. O tempo pára, ficamos todos suspensos, mas uma suspensão em nada masoquista, pelo contrário: uma suspensão absolutamente hedonista e feliz, que nos devolve o prazer em estado puro e exaltado e nos alimenta o desejo sempre produtor de mais e mais desejo de o ouvir sem fim! Portugal inteiro parou para o ouvir. Mas o mais incrível é que Portugal já há muito tinha vindo a perceber que estava parado à espera deste momento. Aliás, Portugal parou logo na primeira vez que o Salvador apareceu na TV. É que o Salvador não é só o Salvador de Portugal, ele é aquele que nos salva-a-dor do nosso passado, aquele que nos renova a identidade portuguesa e que substitui os 3 F (fado, Fatima, futebol) por 3 S: Salvador Super Star!! Sobral, the new religion! Para usar uma expressão que o próprio diz gostar imenso: é a porca puttana da loucura! Já quase não se ouve falar de futebol, o fado deu lugar ao jazz, e até as romarias a Fatima perderam todo o interesse comparadas com a sintonização em Kiev. O Salvador, com os seus 27 anos, veio renovar a própria identidade portuguesa (se é que ela alguma vez existiu ou existe - e no fundo isso também nem interessa, o que interessa é que está a unir os portugueses. Ainda ontem senti uma pequena ressonância com a minha vizinha de baixo que é uma besta só por escutar a música do Salvador que ela estava a ouvir em casa dela).
Comecei a ouvir falar dele antes mesmo de o ouvir ao vivo. A primeira vez que o ouvi, foi na Fábrica Braço de Prata, num concerto de boleros latino-americanos. Foi uma delícia, parecia um pássaro e eu senti-me em plena Havana a pingar com 40ºC debaixo de uma sombrinha. Fiquei imediatamente fã. Há um antes e um depois de se ouvir o Salvador. Ele é realmente messiânico, é o músico por vir que nos traz na sua forma de cantar uma nova e maravilhosa ligação ao mundo. Com Salvador, Portugal passou a ter mais um milagre e quase que desconfio que o Papa vai votar nele no próximo Sabado!
E quanto à sua saúde, só tenho a dizer que ela confirma o diagnóstico de Deleuze quando diz que todo o artista tem uma saúde frágil. Não é só pela música que ele é um anjo. Ele é-o também nessa sua condição de risco de morte eminente, que nos faz ver como, no fundo, somos todos refugiados da morte, e estamos só a viver num barco insuflável que um dia chegará a um porto desconhecido.
Salvador foi o único do festival da canção a resistir ao império da língua inglesa. Resistência pelo devir-menor, devir-português, devir-refugiado. Um grande bem-hajas, Salvador!

Thursday, March 02, 2017

bifurcações, entroncamentos, sentidos únicos, impasses, rotundas e afins

- olhe, desculpe, poderia por favor indicar-me o sentido da vida?
- siga sempre em frente até chegar a uns semáforos e aí corte à esquerda. depois o melhor é perguntar outra vez, ok?
- ok, obrigada!
e seguiu caminho.

Friday, February 17, 2017

ainda hoje ela refere aquele zumbido nos ouvidos como o mote para a sua vida. Ela passou a viver na surdez, uma surdez existencial, tendenciosa, magnífica! só ouvir o que se quer: que mais poderia ela desejar, afinal? depois de tantas desilusões, atingido esse estádio de nausea e cansaço de tudo e de todos, por que não uma radical surdez? E eis que assim ficou decidido: a partir daquele momento, só iria ouvir o que lhe apetecesse! Mesmo que tal decisao lhe custasse a lucidez que ela tanto prezava, ou a imparcialidade de que ela tanto se orgulhava. Finito tudo isso! a partir de agora ela iria ouvir o que a sua vontade lhe ditasse, numa espécie de autismo existencial voluntário. a partir de agora, ela iria consumir do mundo o que a sua própria existência quisesse. Ela queria sentir a vida a acontecer segundo a sua própria pessoa, cansada que já estava de viver de forma ingénua, por vezes até num misto de sonho e realidade, como que numa segunda dimensao ou camada sem forma que sobrevoava, no tempo e no espaço, o mundo dos outros. A partir de hoje, a vida iria tornar-se no seu libreto pessoal. E elea sentia-se muito feliz por ser, finalmente, a maestrina da sua rotina.

Monday, January 23, 2017

amo-te muito, minha querida. e tu já não és assim tão indefesa, já te aguentas. percebe, então, por favor isto: não me peças mais nada. eu falo como eu consigo. já não tenho força para mais. já nem quero ter força para mais! estou exausta de falar. a simples ideia de formular seja o que for angustia-me. e a miragem da chegada de mais alguém na minha vida, mesmo que por instantes, surge-me como a imposição de um intruso. não quero ser hóspede ingrata na vida de ninguém, por isso não me chateiem e não entrem na minha! não peço nada. só peço que me deixem em paz. quero e preciso urgentemente de estar sozinha, de tirar umas férias da civilização!

Saturday, January 21, 2017

o dia seguinte (o vulgo "pós-traumático" ao Trump)

fuck everything! fuck the system! fuck the real, the truth and all kinds of reality! fuck you! fuck me! fuck any concept of individuality! fuck morality! fuck god and the holy spirit! fuck monday and tuesday and every future!!!!! fuck imagination: I want another real!!!

Monday, January 16, 2017

What kind of times are these

What Kind of Times Are These 
by Adrienne Rich

There's a place between two stands of trees where the grass grows uphill
and the old revolutionary road breaks off into shadows
near a meeting-house abandoned by the persecuted
who disappeared into those shadows.

I've walked there picking mushrooms at the edge of dread, but don't be fooled
this isn't a Russian poem, this is not somewhere else but here,
our country moving closer to its own truth and dread,
its own ways of making people disappear.

I won't tell you where the place is, the dark mesh of the woods
meeting the unmarked strip of light—
ghost-ridden crossroads, leafmold paradise:
I know already who wants to buy it, sell it, make it disappear.

And I won't tell you where it is, so why do I tell you
anything? Because you still listen, because in times like these
to have you listen at all, it's necessary
to talk about trees.

Wednesday, January 04, 2017

a redonda noção do tempo que se torna amarga. neblina mental. quero rebentar connosco! temos que nos rebentar de vez! acabou, finito. não somos senão memórias de uma qualquer quimera deixada ao acaso, nada mais. já chega! vai à merda. adoro escrever depois de te mandar à merda. és a minha musa. enche-me de mimos, vá.